Primeiro ônibus brasileiro movido por energia solar já rodou 120 mil km
Lá em 2016, a necessidade de otimizar o tempo em uma distância de 26 quilômetros entre um laboratório de pesquisa e o campus central de uma universidade foi o estopim para a criação do primeiro ônibus elétrico totalmente abastecido com energia solar, no Brasil. Desde então, o eBus, como foi nomeado, vem transportando rotineiramente estudantes e professores da Universidade Federal de Santa Catarina, em viagem circular. Já no final de abril deste ano, o mesmo ônibus completou o equivalente a três voltas ao mundo, em mais de 120.000 quilômetros rodados. A perspectiva é replicar o modelo para as linhas de transporte público, em todo o país.
Com a proposta de deslocamento produtivo, o eBus, no modelo Torino, vem funcionando como uma estação de trabalho móvel ou como uma sala de reunião, com mesas, poltronas, tomadas e rede wi-fi. A otimização de tempo de trabalho foi comprovada pelos acadêmicos, embora o resultado mais chamativo é o baixo custo do quilômetro rodado, equivalente a um quarto do veículo a diesel (hoje com preço médio de 7,44 reais), segundo avaliação do professor Ricardo Rüther, coordenador das pesquisas para o projeto.
Sendo um veículo elétrico, a energia não é consumida quando o ônibus está parado no trânsito, salvo os sistemas auxiliares como o ar-condicionado. Entretanto, essa economia energética nem seria necessária, pois o carregamento de uma hora, feita apenas no final de cada trajeto entre a universidade e o laboratório, já é suficiente para rodar o trajeto. As placas solares instaladas no centro de pesquisa alimentam o veículo, embora o carregamento pode ser feito em qualquer parque solar ou mesmo em outras fontes para carregamento elétrico. “Nós temos uma necessidade de uma nova fonte de energia para gerar essa eletricidade, que, por sua vez, pode ser gerada nos telhados das edificações urbanas. Você não precisa ter placa solar no próprio ônibus ou no próprio veículo”, menciona Rüther.
A especificação técnica do veículo foi realizada pelos pesquisadores do Centro de Pesquisa e Treinamento em Energia Solar, da UFSC, e a montagem do eBus foi feita pelas empresas WEG, Marcopolo, Mercedes e Eletrabus. Desde de dezembro de 2016, o ônibus faz cinco viagens circulares por dia, com exceção do período de pandemia, quando as atividades presenciais na universidade foram suspensas.
Outro detalhe, na geração de energia, é o chamado “freio regenerativo”. Toda vez que o motorista tira o pé do acelerador ou pisa no pedal do freio, a energia cinética – do movimento do ônibus – recarrega as baterias. Segundo estimativa do Centro de Pesquisa da UFSC, até 30% da energia do ônibus vem do movimento da frenagem. No entanto, o professor Ricardo Rüther destaca o investimento inicial no projeto como a principal barreira para a ampliação do projeto. Em função do custo das baterias de lítio e do motor elétrico, a construção do eBus foi três vezes mais cara do que o equivalente a diesel. “O investimento inicial é muito alto. A bateria representa 40% do custo do ônibus. Demonstramos a viabilidade técnica e econômica do veículo pelo baixo custo de rodagem, mas é preciso resolver o problema do alto investimento inicial”, pondera Rüther.
Próximos passos
Desenvolver e rodar o eBus em Florianópolis, uma das capitais menos ensolaradas do país, é um bom indício do potencial da energia solar como fonte de carregamento de veículos elétricos pelo país. O objetivo final do grupo de pesquisa da UFSC é que as licitações municipais de renovação de frotas de ônibus, ao longo do país, possam usar o veículo como modelo. Os pesquisadores almejam uma renovação gradativa das frotas nos municípios. “Isso pode gerar demanda para empresas, para construir mais ônibus elétricos e com isso reduzir o custo de operação e o preço final ao cliente”, menciona o professor da UFSC.
Ao defender o protagonismo do Brasil na indústria de ônibus e caminhões, Iêda de Oliveira, diretora de veículos pesados da Associação Brasileira do Veículo Elétrico (ABVE), menciona a necessidade de mais parcerias entre empresas e universidades para a geração de projetos como o eBus. “A burocracia à parceria público-privada precisa ser reduzida. Quando você consegue aprovar um projeto, e as universidades sofrem muito com isso, se passou tanto tempo que a tecnologia já avançou. As empresas precisam trabalhar com as universidades, como acontece no mundo inteiro”, avalia.